O Engenheiro Civil e Gerente de Regulação da ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), Tito Livio Pereira Queiroz, será palestrante do XV Congresso Intermodal dos Transportadores de Cargas, que ocorrerá no próximo dia 15 de setembro, em Belém (PA).
Em entrevista à ABTC, Tito Queiroz afirmou que o uso de cada modo de transporte depende de diversos fatores inerentes a necessidade do transporte que se deseja realizar. “Tendo em vista a heterogeneidade das cargas e fluxos que ocorrem no país, os produtores e as entidades que necessitam adquirir produtos no exterior ou em outra parte do país precisam ter opções multimodais de transporte. O transporte multimodal é uma necessidade e não uma opção”, concluiu.
Leia abaixo a entrevista completa.
Comunicação ABTC: A multimodalidade ainda tem uso tímido em nosso país, que ainda mantém certa fidelidade aos modelos tradicionais de transporte de cargas, e também pela predominância do modal rodoviário. Acrescenta-se ainda o fato do baixo investimento, no sentido de consolidar esse modelo de transporte. Qual o caminho para mudar esse cenário e consolidar no Brasil a integração dos modais?
Tito Queiroz: A integração entre os modos de transporte no Brasil precisa ocorrer em diferentes níveis de atuação, do planejamento ao acompanhamento e gestão da implementação das soluções elencadas e priorizadas, passando pela normatização e regulação necessárias. Outro ponto a considerar é que a integração multimodal envolve questões de aprimoramento e desenvolvimento das infraestruturas de transporte, mas não se pode desconsiderar fatores operacionais e exigências documentais, que muitas vezes dificultam o uso de diferentes modos de transporte em uma única operação e os próprios transbordos entre modos de transporte. Nesse sentido, verifica-se que a integração multimodal depende da cooperação entre diferentes agentes públicos e privados. A criação do Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil – MTPA, que vinculou os diversos órgãos públicos de transporte a uma única instituição, foi positiva no sentido de propiciar uma convergência dessas entidades numa visão mais multimodal. Contudo, entendo que o efetivo funcionamento do Conselho Nacional de Integração de Políticas de Transporte – CONIT contribuiria ainda mais para a integração das ações do Governo Federal numa visão multimodal e permitiria envolver outros órgãos públicos essenciais nessa discussão, mas que não são da área de transportes, como os Ministérios da Fazenda, Indústria Comércio Exterior e Serviços e da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Complementarmente é necessário que as soluções pensadas para o setor sejam mais embasadas em visões sistêmicas, usando como referência os fluxos completos de carga, considerando os deslocamentos atuais e potenciais. Para isso, o uso do conceito de corredores multimodais de transporte cargas deve ser considerado. Não se trata de um conceito novo no país, já tendo sido utilizado em Planos de Governo na década de 70 e objeto de estudos da Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes – GEIPOT no início dos anos 2000. Mais recentemente o MTPA vem realizando estudos de corredores de transporte, com base nos fluxos dos principais produtos brasileiros. No contexto internacional, temos acompanhado com bastante atenção a implementação dos Trans-European Networks (TEN-T). Essa rede é composta por nove corredores definidos de maneira objetiva e formal, por meio de normas da União Europeia. Entretanto, foi o modelo de governança desses corredores que despertou maior interesse. Em primeiro lugar, há uma metodologia bastante objetiva para a definição, priorização e acompanhamento das ações e projetos que melhor contribuem para atingir os objetivos e metas estabelecidas para cada um desses corredores. Cada corredor possui um Fórum responsável, entre outras atribuições, por elaborar esse plano de trabalho e acompanhar sua implementação. Esse Fórum possui um Coordenador e é composto por vários agentes que possuem interesse no desenvolvimento do corredor, sejam entidades públicas ou privadas, de atuação ao longo de todo corredor ou apenas localmente.
Comunicação ABTC: Quais são os principais entraves para a multimodalidade no Brasil?
Tito Queiroz: Há diferentes necessidades de aprimoramento da infraestrutura do país. Considerando que cerca de 65% da carga do país em TKU (tonelada-km útil) do país é transportada por meio de rodovias, a manutenção dessas vias em condições adequadas de trafegabilidade e segurança é fundamental. Contudo, num contexto de racionalização da matriz de transporte brasileira, é necessário e urgente desenvolver as redes de transporte ferroviário e aquaviário, de forma a ampliar o uso desses modos de transporte, especialmente nas situações em que a característica do transporte (por exemplo, grandes distâncias e granéis sólidos), tornam inadequado o uso do transporte rodoviário. Por fim, ainda no campo da infraestrutura, é necessário que o acesso físico aos pontos de transbordo e a configuração dos terminais estejam implantados de forma a possibilitar a troca entre os modos de maneira mais eficiente e rápida. Contudo, em que pese a importância e necessidade de aprimoramento da infraestrutura de transporte, não se pode desconsiderar que fatores operacionais e burocráticos muitas vezes dificultam o uso de diferentes modos de transporte numa mesma operação e os transbordos entre modos de transporte. Como exemplos podemos citar: chegada da carga pelos modos terrestres aos portos; questões tributárias ligadas ao ICMS; e documentação adicionais exigidas, mesmo quando a operação deveria estar acobertada por um único Conhecimento Multimodal de Cargas.
Comunicação ABTC: O transporte multimodal é a melhor opção para o país? Quais as vantagens e desvantagens?
Tito Queiroz: O transporte multimodal é uma necessidade e não uma opção. O uso de cada modo de transporte depende de diversos fatores inerentes a necessidade do transporte que se deseja realizar, como por exemplo, tipo de carga (granel sólido, líquido, carga geral etc) e seu valor, a distância a ser percorrida, o tempo disponível para entrega da carga etc. Assim, tendo em vista a heterogeneidade das cargas e fluxos que ocorrem no país, os produtores e as entidades que necessitam adquirir produtos no exterior ou em outra parte do país precisam ter opções multimodais de transporte.
Comunicação ABTC: Pelas características geográficas do Brasil, uma solução para os problemas de gargalos logísticos seria um equilíbrio entre os modais, limitados a suas razões mais apropriadas de utilização, o que já tem sido feito nesse sentido? Há algum projeto em andamento?
Tito Queiroz: O país precisa sim equilibrar de maneira mais adequada sua matriz de transportes. Países com dimensões e características mais parecidas com as do Brasil possuem uma maior participação dos modos ferroviário e hidroviário. Contudo, para isso é necessário resolver situações nas mais diferentes áreas de atuação: infraestrutura e suas conexões; questões operacionais, tributárias e exigências documentais; entre outras. Trata-se, portanto, de uma atuação que não depende de um único órgão público, mas de uma ação coordenada e com uma estrutura de governança bem definida. Por isso, entendemos que a abordagem via corredores de transporte multimodais, ancorados em análises sistêmicas das melhorias proporcionadas aos fluxos de carga e em metodologias claras de definição de prioridades, acompanhadas por uma instância de governança com competências bem estabelecidas ajudará nesse processo. A ANTT tem seguido essa lógica no âmbito de suas competências e em diferentes frentes, contribuindo para o desenvolvimento do conceito do transporte multimodal de cargas. No campo da infraestrutura, temos ampliado e aprimorado o modelo de concessão rodoviária de forma a assegurar fluidez, qualidade e segurança ao transporte rodoviário, que não pode ser negligenciado uma vez que, no cenário atual, é responsável por 65% do deslocamento de cargas no país, em termos de TKU. A concessão de novas ferrovias e a renovação do contrato com as atuais concessionárias, mediante contrapartidas concretas de melhoria e ampliação na malha existente, estão entre as prioridades de atuação da Agência. No campo da interoperabilidade, a ANTT tem desenvolvido e está intensificando cada vez mais as ações conjuntas com a ANTAQ de forma a assegurar melhorias nos acessos rodo-ferroviários aos portos brasileiros. A ANTT também tem participado de fóruns governamentais e aplicado soluções que visam reduzir as exigências burocráticas do público por ela regulado. Por fim, vale mencionar as iniciativas de aprimoramento tecnológico, para o melhor acompanhamento do transporte de cargas nas vias terrestres. No entanto, essa ação traz benefícios não apenas para o transporte terrestre: por meio de compartilhamento de informações com outros órgãos, como já tem sido realizado, é possível, por exemplo, coordenar a chegada de cargas aos portos, eliminando as filas de espera dos transportadores rodoviários de carga.
Comunicação ABTC: O que os congressistas do XV Congresso da ABTC, em Belém (PA), podem esperar de sua palestra?
Tito Queiroz: Espero poder detalhar as ideias colocadas nos questionamentos anteriores, que em resumo visam destacar a importância do transporte multimodal e apontar possíveis soluções para que possamos ampliar o uso dos diferentes modos de transporte no deslocamento de cargas no país. Também será uma oportunidade de poder mostrar como a ANTT tem contribuído, dentro de suas atribuições, para o desenvolvimento do transporte nacional de cargas, que é fator chave para o desenvolvimento do País.
Serviço
Evento: XV Congresso Nacional Intermodal dos Transportadores de Cargas
Local: Hotel Grand Mercure – Avenida Nazaré, 375 – Nazaré - Belém (PA)
Data: 15 de setembro de 2017
Inscrições: As inscrições são gratuitas e limitadas e podem ser feitas de 7 de agosto a 12 de setembro, pelo site www.abtc.org.br. Após o dia 12 de setembro, inscrições serão realizadas apenas no local do evento, de acordo com a disponibilidade de vagas.
Informações: (61) 3321-7172 ou pelo site www.abtc.org.br