A saída gradual da quarentena e a volta ao trabalho começam a ser mais debatidas no Ceará, após o governador Camilo Santana prorrogar mais uma vez o decreto estadual que suspende atividades econômicas consideradas não essenciais no Estado. Isso porque representantes do setor produtivo divulgaram ontem (20) um manifesto solicitando a criação de uma comissão, com participação do Governo do Estado, para viabilizar o retorno gradual das atividades empresariais. O documento, assinado por presidentes de 12 entidades que representam setores da indústria, comércio, serviços e agropecuária, propõe que seja encontrado "um caminho que preserve o equilíbrio econômico e social no combate à pandemia". O debate foi iniciado, mas não há expectativa para resolução.
A ideia é possibilitar o retorno gradual de atividades empresariais obedecendo padrões estabelecidos por essa comissão. "O setor produtivo cearense, representado no Comitê de enfrentamento ao Coronavírus do Governo do Ceará pela Fiec, Fecomércio, Fetrans e CDL, manifesta a sua profunda insatisfação pela falta de um plano de flexibili-zação para a retomada gradual das atividades econômicas", diz o manifesto. "A situação atual traz profunda insegurança à sociedade, aos empresários e aos seus colaboradores, informais e autônomos", acrescenta.
O empresário e ex-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará (Fiec), Beto Studart, afirma que em breve haverá essa flexibilização que os setores estão cobrando e que o manifesto é importante. "Eu acho que daqui a pouco vamos ter um final feliz. A indústria já suportou até agora e daqui a 10 dias deverá ser flexibilizado (decreto estadual). Eu acho o manifesto um documento importante porque mostra como estão os empresários e seus trabalhadores. São duas partes (Governo e setor produtivo) dentro do mesmo ambiente do problema. Foi um documento prudente, foi um recado educado. O Governo está estudando e tem que ser decidido baseado nos números da saúde. O Governo quer salvar vidas e as entidades querem salvar vidas e empregos".
O presidente da Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Estado do Ceará (FCDL-CE), Freitas Cordeiro, diz que na última sexta-feira (17) foi enviado um ofício com propostas ao governador, mas não houve resposta. "A gente tem insistido e não vem nada de concreto. O governo não tem se sensibilizado com o pleito das empresas e quando voltar ao momento de poder reabrir, muitas dessas empresas estarão quebradas".
Para Cordeiro, é preciso analisar quais segmentos já podem começar a reabrir sem que haja prejuízo à saúde de funcionários e consumidores. "Queremos uma abertura paulatina. Entendemos que precisamos preparar rotas de saída. Temos de discutir quais atividades podem reabrir sem riscos, qual tem sido o grau de infecção nas farmácias e supermercados. Tem muitas atividades que estão fechadas que tem menos aglomeração do que os bancos, por exemplo. E por que elas não podem trabalhar?".
O presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará (Faec), Flávio Saboya, lamenta a situação dos produtores cearenses, principalmente os pequenos. "Nós somos um estado de pequenos produtores familiares. Temos 230 mil agricultores familiares. Esse é um dos públicos que a gente da Federação luta na tentativa de defendê-los, e o nosso maior problema são os produtores de produtos perecíveis. Eles estão sistematicamente perdendo os seus produtos. Muitos estão sofrendo também por causa da suspensão do transporte intermunicipal".
Propostas
Ontem, o presidente da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado do Ceará (Fecomércio-CE), Maurício Filizola voltou a reforçar o desejo de reabrir de forma gradativa, com horário de funcionamento reduzido e menor número de funcionários por turno.
"Todo o setor produtivo cearense está em busca de uma solução para o retorno das atividades normais", aponta. "A nossa expectativa é de que avancemos com as propostas criadas por esse grupo de trabalho. O governo tem dado um foco importante para a saúde, mas agora é hora de olhar com mais profundidade a área econômica".
No mesmo sentido, a Federação das Empresas de Transportes de Passageiros de Ceará, Piauí e Maranhão (Fetrans) disse em nota manifestar "preocupação com a falta de um plano de flexibilização para a retomada gradual das atividades econômicas" e que, liderada pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), "tem implementado esforços na adoção de estratégias internas e com os governos em prol da manutenção dos empregos e salários e da sustentabilidade financeira das empresas, garantindo as atividades de transporte".
Para os signatários do manifesto, é "inconcebível" que após um mês de isolamento e de sua prorrogação até o dia 5 de maio "o setor produtivo não tenha recebido nenhuma proposta clara, nenhum plano específico, nenhum cronograma" sobre os pleitos apresentados pelas entidades para a reabertura dos negócios.
"Muito pelo contrário, ao insistir em um pseudo conflito de interesses entre a saúde pública e a economia, estamos assistindo medidas que paralisam a atividade produtiva e que terão impactos duradouros e diretos na saúde financeira de todos os cearenses", diz o documento.
Condições para retorno
Segundo o secretário de Desenvolvimento Econômico e Trabalho do Ceará (Sedet), Maia Júnior, a flexibilização está condicionada ao controle do número de casos de pessoas com coronavírus, ao número de leitos hospitalares disponíveis e a um rigoroso protocolo de higiene por parte das empresas. "Não tem cronograma (para a abertura) porque ainda estamos num trabalho muito inicial. Ainda estamos nos primeiros 30 dias de isolamento, com toda dedicação à área da saúde. Quem está começando a flexibilizar está fazendo isso após 90 dias dos primeiros casos", disse o secretário.
De acordo com o secretário, já está sendo montado pelo governo um grupo de trabalho para avaliar uma "possível desmobilização". "Estamos aguardando a indicação de alguns secretários e esperamos também ouvir as propostas dos setores produtivos, porque até agora só teve pressão", disse.
Empregos formais
No documento, as entidades ressaltam ainda que representam mais de um milhão de empregos formais no Estado, o equivalente a 73% de todos os empregos do Ceará e respondem por 76% do PIB estadual. "Desse modo, (as entidades) estão preocupadas em não serem omissas, diante do desafio de manter empregos e salários de seus colaboradores".
Fonte: Diário do Nordeste