Quinta, 23 Mai 2013 11:10
Estímulo ao consumo do etanol esbarra no alto custo
Acostumado a abastecer com gasolina, por conta do custo/benefício, o consumidor foi pego de surpresa com o apelo
"Mais potente, polui menos, é renovável e gera muito mais empregos. O etanol é o combustível completão". Este é o slogan de mais uma campanha, veiculada na TV, para incentivar o consumo de etanol em veículos em todo o País. Nos últimos anos, acostumado a abastecer o carro com gasolina, por conta da comparação custo/benefício entre esses combustíveis, o consumidor foi pego de surpresa com o apelo. Como justificar a iniciativa, quando financeiramente o uso do álcool, como é popularmente conhecido, não é vantajoso para o consumidor?.
Segundo os especialistas, abastecer com etanol só vale à pena quando o preço do litro não ultrapassar 70% o da gasolina. Uma relação que está longe de existir em muitos Estados, a exemplo do Ceará. Conforme o último levantamento semanal da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), essa proporção chega a 84% no Estado, tendo em vista um preço médio de R$ 2,353 para o etanol e de R$ 2,809 para a gasolina.
Mercado
Não é à toa o vertiginoso aumento no consumo do derivado de petróleo em detrimento do combustível a partir da cana de açúcar. Nos últimos cinco anos, a venda do primeiro saltou de 615,54 milhões de litros no Ceará para 1,12 bilhão, um avanço de quase 82%. Ao passo que, ao contrário, a comercialização de etanol despencou aproximadamente 40%, saindo de 152,94 milhões de litros, em 2008, para apenas R$ 93,42 milhões, no ano passado. Os números também são da ANP. Para se ter uma ideia, atualmente, a gasolina representa aproximadamente 38% do total de combustíveis consumidos anualmente no Estado, enquanto o álcool 3,2%. Há cinco anos, esse mercado era maior, pois a representatividade chegava a 7,42%, com a gasolina detendo 31%.
Causas
"Fatores como o direcionamento da cana para fabricação de açúcar em detrimento do etanol prejudicaram o desenvolvimento desse combustível no Brasil, fazendo com que a oferta fosse menor, impactando, assim, no preço. Ao mesmo tempo, uma política energética focada no petróleo, por conta do pré-sal, e com o governo desonerando a gasolina, fez também com que o preço do álcool passasse a ficar desvantajoso", explica o assessor de Economia do Sindicato do Comércio Varejista de Derivados de Petróleo do Ceará (Sindipostos), Antônio José Costa.
Conforme disse, há uma década, embutido no preço da gasolina estavam R$ 0,59 relativos à Cide, que hoje em dia não são mais cobrados. "Se atualmente a Cide ainda incidisse no custo da gasolina, o consumidor estaria pagando, em média, bem mais que R$ 3,00 no litro", argumenta. "Então, tudo isso fez com que o preço da gasolina se aproximasse do valor cobrado pelo etanol, desestimulando o seu consumo", afirma.
De acordo com Costa, a campanha de incentivo ao uso do álcool não deve surtir efeito no curto prazo. "Financeiramente, consumir etanol não vem sendo vantajoso, só se o consumidor for educado ambientalmente para isso, pois proteger ao meio ambiente atualmente é a única vantagem para o consumo", argumenta. "Entretanto, com as medidas recentemente adotadas pelo governo a fim de estimular a produção e aumentar a oferta de etanol, no médio prazo, dentre uns três a quatro anos, quando o canavial estiver renovado e as usinas estiverem utilizando um novo maquinário, os preços do etanol tenderão a baixar nas bombas", emenda.
Em abril deste ano, o governo federal anunciou um pacote de benefícios para o setor de açúcar e álcool: elevou o percentual de etanol na gasolina de 20% para 25%; vai fazer uma compensação tributária que equivale a zerar o PIS e a Cofins do etanol; assim como reduziu de 9,5% para 5,5% a taxa de juros anual da linha de financiamento voltada à renovação dos canaviais; e de 10% para 7,7% naquela para investimentos em estocagem do produto. O objetivo principal é viabilizar condições para que o setor faça mais investimentos. Entretanto, não garantiu queda no preço do etanol.
Diferença
22 reais é quanto o consumidor vai pagar a mais se decidir encher um tanque de 50 litros com gasolina em vez de álcool, tendo em vista os preços médios no Ceará.
Opinião Do Especialista
Faltou vontade e regulação
Creditamos a uma combinação de fatores, que causam incertezas no mercado consumidor e especulação de preços ao longo da cadeia de abastecimento quando da escassez, o fato de o consumo de etanol ter caído tanto. Ele é uma commodity sujeita aos movimentos do mercado. Caso o preço internacional seja atrativo, parte-se para a exportação deixando-se o mercado interno em segundo plano. Devemos lembrar que pelos mesmos motivos, o Pró-Álcool nos idos dos anos 70 acabou fracassando pela insegurança da disponibilidade aliada a baixa tecnologia à época de motores movidos a esse combustível. E a vantagem financeira para o uso do etanol fica limitada quando seu preço atingir 70% do preço da gasolina nas bombas. Vejo que faltou e falta vontade política e regulamentação clara e firme nas áreas de produção, distribuição e revenda, incluindo estoques reguladores nas entre safras. Temos nas mãos a "galinha dos ovos de ouro" como alternativa energética e não estamos sabendo tirando proveito de uma fonte renovável e sem o impacto negativo no meio ambiente. Se aplicarmos uma logística de transporte e abastecimento inteligentes não haveria razões para a discrepância de preços entre regiões.
Bruno Iughetti
Consultor de Petróleo e Combustíveis
Produtores do NE terão R$ 425 mi
O governo federal anunciou na última segunda-feira (20) uma ajuda de R$ 0,20 por litro de etanol para produtores do Nordeste para a safra deste ano. O total do benefício será R$ 425 milhões, segundo informou o secretário executivo adjunto do Ministério da Fazenda, Dyogo de Oliveira. "O anúncio tem a ver com o processo de negociações que estávamos tendo com os produtores rurais e com os produtores de etanol em função dos prejuízos que estão tendo nos canaviais", explicou.
A ajuda está na Medida Provisória (MP) 615, publicada no mesmo dia no Diário Oficial da União, que também autorizou uma subvenção para produtores de cana-de-açúcar do Nordeste e o financiamento da renovação e da implantação de canaviais.
Oliveira diz que haverá uma readequação do Orçamento para conceder os benefícios. "Estamos verificando como será feita a adaptação do Orçamento, mas, com certeza, será feita respeitando os limites de despesas e de superávit primário". Para ter direito à ajuda, o produtor terá que apresentar à Agência Nacional do Petróleo (ANP) a comprovação de produção do etanol.
A MP também traz uma nova possibilidade de o governo capitalizar a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), que irá financiar parte da redução na conta de energia. Além da aplicação de recebíveis, o governo poderá colocar títulos da dívida pública na CDE. "É uma prerrogativa meramente operacional ", disse o subsecretário do Tesouro Nacional, Cléber de Oliveira.
Extraído de: Diário do Nordeste